A primeira carta de João é um guia muito prático de discipulado. Diferente do seu evangelho, que foi escrito “para que vocês creiam que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus e, crendo, tenham vida em seu nome” (Jo 20.31), João escreve esta primeira carta “a vocês que crêem no nome do Filho de Deus, para que vocês saibam que têm a vida eterna” (1 Jo 5.13). João está dizendo, basicamente, “Se você leu o meu evangelho e creu em Jesus, esta carta é o próximo passo”. Esta declaração de propósito é uma de três que se encontram em 1 João. A primeira está no capítulo 1, que diz que ele está escrevendo “para que a nossa alegria seja completa” (v. 4).
Neste post eu queria concentrar na terceira declaração de propósito da carta de João, que está no primeiro versículo do capítulo 2. Diz que João escreveu a carta “para que vocês não pequem”.
Não pequem? João endoidou de vez? Que conversa maluca!
O contexto deste versículo declara que nós somos pecadores (1.8), que já pecamos (1.10), e que vamos pecar novamente (2.1). João não está sendo ingênuo quando declara este propósito: ele entende como as pessoas são. A grande diferença entre João e o cristão pós-moderno é que ele não aceita a mediocridade. Ele não vai sentar e dizer, “Pois é, sou humano. Vou falhar. Deus tem que aceitar isso”. Nos nossos esforços desesperados de nos livrar da escravidão do legalismo, as nossas respostas contemporâneas lançaram o pêndulolá para o outro lado, e nós vemos que chegamos ao ponto de aceitar comportamentos e atitudes inaceitáveis.
O que deu errado? É interessante que o próprio João tratou de duas atitudes chaves que agravam a nossa situação atual: a noção que não há nada de errado (estamos sem pecado), e a noção que não fizemos nada de errado (não temos cometido pecado).
“Tudo azul”.
Ninguém procura uma solução quando não enxerga um problema. Existe um ditado em inglês: se não está quebrado, não conserte. Basta apenas assistir um pouco de televisão para ver que a sociedade tem mudado muito a sua opinião do que certo e o que é errado. Existem comédias que aceitam todo tipo de imoralidade e comportamento tosco como sendo normal. Ou dramas de detetives que expõem o submundo violento e perverso da humanidade, mas que põem a culpa em tudo menos na depravação humana. Ou a paixão atual que a sociedade tem pelos vampiros, lobisomens, e zumbis. Todas apontam para o mal que está no nosso coração. Mas se olharmos mais atentamente, a linha entre o bem e o mal está embaçada. Por trás da máscara do “realismo” este tipo de entretenimento não só aceita, mas leva a audiência a aceitar, toda espécie de ideia claramente contrária a palavra de Deus. Não estamos nem falando das famosas áreas duvidosas; isto é a plena aceitação do errado como sendo normal e razoável. João não deixa dúvidas: “Se afirmarmos que estamos sem pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e a verdade não está em nós” (1 Jo 1:8). O conceito que somos “apenas humanos” e portanto devemos ver nossas falhas como sendo aceitáveis é uma ilusão—estamos mentindo a nós mesmos. Gente, não está tudo azul. Nós estamos completa e irrevogavelmente quebrados (Rm 3.10, 23). Se nós não admitirmos isto, não procuraremos uma solução para o nosso problema.
“Não fiz nada de errado”.
Agora passamos da conta mesmo, pois vamos além de enganar a nós mesmos, e chamamos o próprio Deus de mentiroso (1.10). Não só vivemos na condição de pecador, como somos pecadores incorrigíveis. João declara isto no contexto da confissão de pecados no versículo 9, então inclui a ideia que a confissão só acontecerá se admitirmos o nosso erro. Desde o momento que Adão apontou o dedo para Eva, e Eva para a serpente, o homem tem aperfeiçoado a arte de apontar o dedo para qualquer coisa além dele mesmo. A verdadeira confissão só acontecerá quando nós assumirmos responsabilidade pelo nosso pecado: “Contra ti, só contra ti, pequei e fiz o que tu reprovas, de modo que justa é a tua sentença e tens razão em condenar-me” (Sl 51.4). Não há salvação sem a admissão do pecado; não existe arrependimento sem que viremos as costas para o pecado; não pode haver perdão sem assumirmos a responsabilidade dos nossos pecados.
Mas como saber isto leva a alvo de João que “não pequemos”? Ele desenvolve esta dinâmica ao longo da sua carta, mas podemos resumir assim: “Esta é a mensagem que dele ouvimos e transmitimos a vocês: Deus é luz; nele não há treva alguma” (1 Jo 1:5). Como seguidores de Cristo—aqueles que entenderam a mensagem do evangelho para que “pudessem acreditar”—devemos trilhar um caminho caracterizado por ser completamente contrário ao pecado. Luz e trevas não coexistem numa harmonia bela e tolerante. Leia novamente: “Deus é luz. Nele não há treva alguma. Nada. Zero”. diz João. “Meu alvo, se vocês escutarem, é ajudar vocês a viverem tão próximos à luz que vocês cheguem ao ponto que o pecado não é mais um problema na sua vida. Ou seja, que vocês não pequem.”
“Não pequem”.
Clamamos: “Isso é impossível!”
Ouvimos a resposta de Deus: “Imaginei que vocês falariam isso. Já lhes disse várias vezes, mas vale a pena repetir: ‘Para o homem é impossível, mas para Deus todas as coisas são possíveis'” ((Mt 17.20; 19.26; Mc 10:27; Lc 1:37; 17:1; 18:27).
É hora de arregaçar as mangas, vestir a nossa armadura, e avançar contra os portões do inferno. Temos muitos pecados a não cometer!
